
O trabalho após a maternidade é um tema delicado, por diversos motivos. Em primeiro lugar, ao falarmos em trabalho e maternidade, estamos falando sobre separação mãe-bebê. O objetivo deste artigo é trazer algumas inspirações para mães e pais que sentem uma preocupação neste sentido e querem trilhar um caminho saudável e feliz no decorrer deste processo.
O trabalho que a mãe realiza profissionalmente costuma ser a primeira atividade que a separa do bebê por mais tempo após o nascimento. Mesmo se realizam tarefas relacionadas à vida doméstica durante o período de afastamento da atividade profissional, é comum que as mães tentem conciliar o cuidado do bebê com fazer o almoço ou colocar a roupa para lavar na máquina. Os carregadores de bebê ajudam nesse sentido pois a mãe pode (e deve) estar com o bebê atado ao corpo durante o dia enquanto realiza algumas atividades. E a maioria dos bebês demanda muito contato físico, então, é interessante recorrer a este acessório sempre que possível, que é mais condizente com as necessidades do bebê do que o próprio carrinho de passeio, bebê conforto ou cadeiras de balanço. Sempre bom lembrar também que, suprida a necessidade do colo, estar no chão de barriga para cima é o melhor lugar e posição inicial para que o bebê se descubra em suas possibilidades motoras e construa sua autonomia postural com segurança e sem barreiras.
Nesse sentido, vamos olhar um pouco então para a volta ao trabalho profissional, que não vem depois de um período de férias mas sim de um período de uma intensa experiência de parto, nascimento e primeiros meses de vida, um intenso trabalho psíquico, poderíamos chamar assim, que envolve o cuidado do bebê, muitas vezes diversas outras tarefas e uma série de desafios e descobertas.
A volta pode ocorrer em diversos momentos após o nascimento do bebê. Aos 4, 5, 6, 7 meses ou mais tempo após o parto, conforme os diferentes contratos de trabalho, flexibilidade das instituições para postergar este retorno ou diferentes tipos de carreiras. E pode ocorrer também por períodos do dia variáveis, meio-periodo (4h/dia), 30h por semana, 40h ou 44h por semana, com viagens ou em homeoffice… As possibilidades são inúmeras, conforme as atividades profissionais da mãe. O que me parece muito comum em meio a tantas variações de contextos de vida é que neste momento muitas mulheres se questionam se faz sentido retomar as atividades que exerciam até então ou se faz sentido retomar com a mesma carga horária ou configuração. Esse questionamento pode ser muito libertador, pois vem de um apelo muito forte que a chegada da criança traz para que sejamos mais autênticas e mais realizadas em nossa trajetória existencial.
Algo que aparece com muita frequência também nessa fase é a insegurança, culpa ou dificuldade de confiar em outras pessoas para o cuidado do bebê. Este é um ponto crucial pois muitas mães podem se sentir extremamente sem saída diante desta situação de por um lado quererem se voltar um pouco mais aos seus interesses individuais e por outro não querer delegar o cuidado do bebê a mais ninguém. Muitas vezes recebo no consultório ou atendo por skype mães com um filho ou filha de 2 anos que nunca ficou com nenhuma outra pessoa sem sua presença. Com relação a isso, proponho a escuta terapêutica individualizada de cada caso para que possam ser esclarecidas as dúvidas e melhores possibilidades de cada família.
Voltar ao trabalho pode ser algo extremamente sofrido se a mãe que cuidava integralmente do bebê ao longo de seus primeiros meses de vida, pelo término do período de licença remunerada, tem que voltar de uma vez e isso implica passar 9, 10 ou 12 horas consecutivas por dia longe do filho de poucos meses. Aí estamos diante de uma separação extremamente brusca e precoce entre mãe e bebê. Tende a ser uma experiência sofrida no sentido de ser contrária à natureza da relação mãe-bebê, neste período ainda em plena fusão emocional. Muitas mães escutam nessa hora: “Mas é o bebê que está sofrendo ou é você? Vocês vão se adaptar…” Pois muitas só choram nesse período e sobrevivem à base de remédios fortes para conseguir seguir com a rotina. Algo para pensarmos, se a adaptação que irá ocorrer é sem prejuízo para ambos, mãe e bebê. E os bebês geralmente buscam compensar as horas do dia em que ficaram afastados ficando mais acordados durante a noite ou adoecendo com mais frequência.
Lembro-me bem de uma paciente que veio ao plantão psicológico no primeiro dia da sua volta ao trabalho após 7 meses do nascimento da filha contando como estava arrasada e dizendo: “No escritório, sou extremamente substituível. Para a minha filha, não.” Não à toa, em alguns países como a Espanha e mesmo no Brasil em algumas instituições há a possibilidade de redução de jornada de trabalho enquanto a mãe estiver amamentando o bebê, sem prejuízo de seus vencimentos. Aí podemos visualizar que existem as alternativas para construir gradualmente essa uma volta em que mãe e bebê possam ir se separando gradualmente sem trancos e barrancos.
Voltar ao trabalho pode representar para muitas mulheres um grande prazer e um grande alívio, sem que isso precise implicar nenhuma culpa. Pois trabalhar é retomar a independência, voltar a realizar uma atividade relacionada aos interesses anteriores à maternidade e é também a possibilidade de voltar a participar por mais tempo do mundo adulto, falar com pessoas que falam com você e agir em processos em que as coisas acontecem com começo, meio e fim. Com o bebê não tem nada disso e ficar exclusivamente nesse universo por muito tempo pode ser muito solitário e sofrido. Trabalhar, seja num programa de computador ou numa tela de pintura, é a potência de realizar algo no próprio ritmo e direção junto dos outros. É gerar riqueza e contribuição para o mundo que vai permanecer aí e do qual as crianças vão desfrutar agora e no futuro.