Parto e relaxamento: como podem ser aliados?

Falar sobre essa dupla parto-relaxamento é um prazer depois de ter vivido a experiência de um parto natural, rápido, tranqüilo, sem intervenções, que confirmou minha aposta de que este é um caminho possível para a maioria das mulheres. Quero com este texto transmitir essa confiança do potencial que as mulheres têm para parir e os bebês para nascer com a ajuda do trabalho de relaxamento.

Não vou me deter aqui tanto aos argumentos em favor do parto humanizado ou do parto natural. Já existem alguns veículos brasileiros disponíveis para esta finalidade (afora os de outros países), que tem apresentado com clareza as razões pelas quais o parto humanizado e mais natural possível são benéficos para mães e bebês e para a sociedade como um todo. Aprendi muito sobre este assunto no Gama – Grupo de Apoio à Maternidade Ativa, que tem site, palestras e cursos. E também em livros sobre gestação e parto, em especial: Parto Ativo – Guia Prático para o Parto Natural (Janet Balaskas) e Hypnobirthing – The Mongan Method (Marie. F. Mongan). O documentário “O Renascimento do Parto” também é primoroso em termos de informações sobre o assunto, tendo sido inclusive disponibilizado pelo Ministério da Saúde no youtube.

A parte que me cabe aqui se soma ao aspecto das informações que esses meios elencados acima oferecem para uma boa gestação, preparação de parto e construção familiar. Quero chamar atenção para o a singularidade desses processos. As informações que podemos obter através de vídeos, palestras, livros, cursos, ainda que fundamentais, não falam sobre a gravidez, o parto de cada casal e de cada bebê e a formação de cada família. Para isso, é preciso um olhar mais próximo às peculiaridades que dizem respeito a cada um de nós.

Falando de parto e relaxamento, é fácil de perceber que a distensão muscular e a auto-confiança contribuem para um estado de espírito sereno em situações de estresse. Se uma pessoa está agitada, com o coração acelerado, ela procura respirar mais lentamente para diminuir a freqüência dos batimentos… Se alguém está chorando, impactado por alguma situação difícil repentina, lhe oferecem um copo d’água, um lugar para sentar-se… Uma criança que está nervosa por qualquer motivo, por exemplo, inspira a vontade no adulto de dar-lhe colo e atenção. Todas essas estratégias para desacelerar o que está aflito, amenizar o que está difícil. 

O parto é carregado de intensidades. Um processo em que mãe, pai e bebê estão experimentando diversas sensações pouco familiares, que causam impacto e desconforto. Não à toa o bebê chora ao nascer, como diz Nelson Cavaquinho: “Nunca vi ninguém nascer sorrindo”. E não raro também a mãe chora ao parir, o pai ao ver o filho pela primeira vez.

Acontece que nascer naturalmente é o processo mais confiável que existe, sem o qual a humanidade, existente há milhares de anos, não teria se perpetuado. As ciências, a fisiologia humana, nos ensinam que quando o bebê está pronto para nascer, ou seja, concluiu sua etapa de amadurecimento intra-uterino, são secretados hormônios que disparam o trabalho de parto. As fibras musculares que revestem o útero começam a trabalhar para abrir o caminho de passagem do bebê – o útero tem um orifício que se abre neste processo – e este também vai se movimentando precisamente através de giros e manobras que faz por conta própria para se encaixar da forma mais conveniente nos espaços que o corpo da mãe naturalmente vai abrindo para que ele nasça. Tudo parece muito simples? E de fato, é. E por que então o parto normal pode parecer tão complicado?

Tenho a impressão de que o que complica o parto, muitas vezes, é o excesso de tensão decorrente de situações estressantes. Por que muitas mulheres ao irem ao hospital, em pleno trabalho de parto, com boa dilatação, acabam sofrendo uma desaceleração do processo, que acaba terminando numa cesárea? A ida ao hospital e tudo o que a envolve (trânsito, exposição a ruídos, movimentos bruscos, burocracias, demora para atendimento, violência obstétrica) é muitas vezes um estresse muito grande, que tira o chão desta mulher que está super sensível a tudo o que acontece ao seu redor, a um comentário da atendente da recepção ou um buraco no asfalto, com os hormônios todos a mil e a expectativa da chegada de um filho.

Para além disso, que é uma situação muito comum, se a mãe não está segura de algum aspecto com relação ao seu parto isto pode dificultar. Se ela tem preocupações em relação ao seu parceiro ou à família, isto joga contra o parto tranqüilo. Se ela tem dúvidas quanto à conduta dos profissionais que irão atendê-la ou atender o bebê, isto tende a interferir. Se faltou fazer algo que para ela que era importante estar feito antes do bebê nascer… Enfim, o que tirar a tranqüilidade e fizer com que esta mulher fique enrijecida, tensa, preocupada, ao invés de estar confiante, desejosa de que seu filho chegue, de que passem juntos pela experiência do parto para finalmente depois de tantos meses, poderem se olhar…     

Este é o espírito do trabalho com relaxamento na gestação e preparação para o parto. Proporcionar que o momento desse encontro face a face possa ser vivido o mais plenamente possível. Escutar os desejos investidos nesse parto que se aproxima e construir junto com muita sutileza o caminho até ele. Ajudar a planejar por um lado, fazer as escolhas mais coerentes com os desejos e valores da família, e a relaxar, observar-se a si mesma, por outro. Ter momentos anteriores ao parto para treinar a identificação dos sinais do corpo, os condicionamentos importantes que desenvolvemos ao longo da vida tanto de tensão quanto de relaxamento e das formas de alívio do desconforto que mais funcionam para si.

Faço questão de frisar aqui o olhar psicoterapêutico. Existem muitas formas de trabalhar com relaxamento, na educação física, na fisioterapia, nas diversas áreas que se propõe a mexer com o corpo. Entretanto, na abordagem psicológica do relaxamento, as questões que a vida apresenta como desafios, muito singulares de cada pessoa, são integradas ao trabalho corporal. Nos encontros que proponho, falamos sobre o que foi vivido durante a aplicação da técnica realizada, quais foram as imagens, sensações, sentimentos, lembranças que apareceram, o que suscitam, como podem ser compreendidos. Este movimento de voltar-se para si e olhar para o que aparece traz a intimidade, a familiaridade, a confiança na própria capacidade de perceber-se e de lidar com a diversidade de sensações e sentimentos aí envolvidos.

Acredito que estes sejam nossos grandes aliados para um parto pleno. O bom entrosamento com as próprias necessidades e com como atendê-las para que juntos, os pais e o bebê, sendo os grandes protagonistas dessa história, possam fazer seu caminho de nascimento.

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