A criança não é um futuro adulto. É uma criança!*

Neste dia das mães, escolhi falar sobre criança. Algumas escolas têm feito o movimento de questionar essa data comemorativa, assim como o dia dos pais, já que se torna um martírio para as crianças que não tem uma família com a configuração convencional. Acho interessante esse questionamento. Então, escolhi focalizar a relação entre adultos e crianças, sejam pais, mães ou quaisquer outros cuidadores.

E falar de criança é falar de educação e da nossa compreensão atual da educação. 

Na nossa visão atual, a educação ficou grudada com a escola, como se os pais delegassem à escola a tarefa da educação. E não se trata de colocar a culpa nos pais pois é exatamente isso que a sociedade de forma geral naturalizou e espera deles, já que trabalham o dia todo e não têm como cuidar disso. Muitas famílias também fazem caminhos alternativos, revendo as prioridades na fase em que os filhos são pequenos, mudando de atividade profissional para conciliar melhor trabalho e cuidado das crianças, às vezes mudando de cidade ou até mesmo de país. Porém, por conta da necessidade dos pais de voltar ao trabalho, a realidade é que a maioria das crianças vão para a escolinha com poucos meses de vida. 4 meses, 6 meses, 7 meses… 

Com isso, faz-se de fundamental importância resgatar o papel da educação, tanto escolar quanto familiar. Muitas das pedagogias que encontramos nas escolas atualmente se preocupam em formar uma criança que seja de um determinado jeito quando adulta, um futuro adulto. E os pais também muitas vezes ao procurarem uma escola, se preocupam com o que ela pretende desenvolver no seu filho, visando o futuro. Aí eu me pergunto: Onde acontece o olhar para a criança enquanto criança? Suas experiências e necessidades atuais? Sua singularidade? Quem está ouvindo e vendo efetivamente a criança, de modo que ela possa viver o processo de descoberta de crescer e criar-se a si mesma que lhe é tão peculiar? 

A criança sendo nova no mundo, recém-chegada num mundo antigo que lhe é estranho e totalmente novo, precisa descobrir. E dentre as condições da vida humana não tem nenhuma mais esperançosa que a natalidade, o fato de que seres novos chegam ao mundo e trazem com a sua chegada a transformação de tudo o que já estava antes. A cada bebê que nasce, o mundo todo se reinicia! Esta sendo nossa esperança, não será também nossa maior tarefa como adultos? 

Resgatando a origem das palavras… 

Para os antigos gregos, criança (pais, paidós) era uma palavra que tinha a mesma origem de educação (paidéia), que significa, ação de instruir, criar, crescer. É dessas palavras gregas que vem por exemplo pedagogia, pedagogo, que estão atreladas nessa origem ao crescimento humano, numa comunidade com os outros no mundo. No latim, os verbos creare e crescere, que significam criar e crescer e tem a mesma origem de creantia (criança), se separam de educar, que provém do latim educare, que significa criar animais ou plantas, orientar, conduzir, levar para algum lugar. Educação, então, que no grego tem a ver com criação e crescimento humano, na acepção latina, se distancia da especificidade da criança pois se refere ao processo que ocorre com os seres vivos em geral. 

A idéia de desenvolvimento, por exemplo, que usamos de forma corriqueira, está dentro do referencial latino. O núcleo está lá e precisa se desenrolar, se des-envolver, como um novelo, num fio linear, já determinado pelo que tem dentro, de uma certa maneira. Crescer, por outro lado, é o tempo todo para fora, como uma pedrinha que cai num lago e gera ondas concêntricas cada vez mais amplas em torno de si, em interação constante com o seu meio. Posso dizer que prefiro este olhar que percebe a criança desde o nascimento já fora, junto ao mundo e aí no mundo se criando. Não nasce envolvida num novelo de lã imaginário, que vai se desenrolando para que ela finalmente venha a aparecer. 

*Texto escrito a partir de discussões e leituras do curso Daseinanalyse e Criança, na Associação Brasileira de Daseinanalyse, ministrado por Beatriz Cytrinowicz.

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